Gestão de Indicadores para Customer Success

Foto do sol sobre a praia no litoral sul, com um céu encoberto pela fumaça das queimadas no Pantanal brasileiro em 2020, fazendo referência a um indicador.

Em meados deste turbulento ano de 2020, o ex-CEO do LinkedIn Jeff Weiner deixou a cadeira. Com sua saída, seu antecessor não menos conhecido Reid Hoffman listou em um post na plataforma social alguns ensinamentos e características que admira em Weiner, dentre estas, sua habilidade em lidar com indicadores. Hoffman diz no texto:

“… [Weiner] construiu um conjunto de dashboards que o mostrava métricas de toda a organização, dando a ele incríveis insights. Por exemplo, com cerca de seis meses como CEO, ele levantou às 5h da manhã para revisar os números e viu algo que não compreendia. Então ele chamou o líder de produto e disse: ‘Há algo errado com seu produto’. O líder de produto surpreso perguntou: ‘Como assim?’ e Jeff respondeu: ‘Há algo errado. Esse número não está coerente com os demais números. E a única maneira disso acontecer é existindo algo de errado com seu produto’. O time de produto investigou e descobriu que a ferramenta de notificação por email não estava disparando notificações; e o erro refletiu naquele número específico que Jeff questionou.”

Complementa Hoffman que:

“O ponto aqui não é microgerenciamento, o que Jeff não faz. Mais que isso, a vantagem dos dashboards era a de prover uma visão compreensiva que todos pudessem ver, arquitetar seus processos de trabalho com aqueles dashboards e desenvolver um tipo de atenção sutil que o permite ver quando um número simplesmente está errado”.

Nesta reta final do ano, momento em que revisamos planos e nos preparamos para um novo ciclo, decidi reunir aqui alguns aprendizados sobre a gestão de indicadores. Espero que ao menos um deles seja útil para você e sua organização em 2021.

Em uma sentença

Bons indicadores para Customer Success (e para todos os demais times) são aqueles que comunicam problemas de forma viável, sem criar um ambiente de insegurança.

Vamos analisar essa frase juntos?

Como disse Hoffman sobre a habilidade de Weiner de gerenciar com a ajuda de indicadores, o objetivo de mensurarmos algo que queremos acompanhar está na possibilidade de enxergarmos problemas que possamos resolver. O contrário disso seria simplesmente não darmos atenção a um problema latente… Não se fala mais nisso, mas também não se resolve o problema, que continuará existindo até não ser mais possível resolvê-lo.

A palavra problema ocupa com razão um espaço central no tema gestão. Afinal, gerenciamos uma iniciativa para resolver problemas de indivíduos e comunidades, não é mesmo? Como escrevi em outro post, é a partir do contexto em que percebemos o problema que devem ser definidos os indicadores, não o oposto. E veja como uma percepção diferente do problema traz indicadores, e resultados, diferentes: quais indicadores para Customer Success você priorizará em 2021? O tempo médio de resposta do time de suporte ou a taxa de solução em primeira resposta?

Ambos estão ligados à mesma função, aos mesmos processos, e possivelmente impactando um, impactaremos o outro; mas enquanto o tempo médio de resposta reflete possíveis problemas internos, de fila e capacidade de atendimento, a taxa de solução em primeira resposta reflete diretamente o impacto do time de suporte na experiência do cliente. Ambos são importantes ao bom funcionamento de uma organização, mas percebe que a partir da taxa de solução colocamos os problemas do cliente em primeiro lugar?

Neste ponto, vale destacar que uma organização pode ser a melhor em seus processos os mais eficientes quanto for possível, mas sem a eficácia necessária à solução dos problemas de seus clientes, aqueles que são o fim de sua existência como organização, cedo ou tarde encontrará problemas para se sustentar e os exemplos de organizações que seguiram por este caminho são vários.

Indicadores para Customer Success e comunicação

Digo ainda que bons indicadores comunicam porque, quando são apresentados sem nos permitir trabalhar sobre os problemas destacados, perdem sua função de controle e tomada de decisão, veja: quando o time de controladoria da matriz diz que a unidade de negócios local não bateu sua meta de lucros porque a reforma do escritório custou mais que o previsto, está não só penalizando o time local, como não o permite agir neste cenário.

Se, ao invés disto, mostrasse que o time de vendas bateu sua meta de lucro mensal, embora tenha ficado abaixo do esperado no comparativo de vendas ano a ano; e que os gastos inesperados com a reforma do escritório pesaram negativamente nos resultados mensais da unidade, daria oportunidade ao gestor de vendas de se perguntar quais impactos frearam as vendas naquele mês e o que poderia ser feito no mês seguinte para recuperarem este número; e daria ao gestor administrativo oportunidade para questionar se os gastos extras poderiam ser previstos ou poderiam ser tratados contingencialmente, preventivamente.

Neste segundo cenário, o que temos é um conjunto de indicadores que comunicam problemas sob a responsabilidade de quem é comunicado. Como no caso relatado no início do texto, dos dashboards de Weiner, um indicador o mostrou que existia um problema em um de seus produtos. O problema em si não era conhecido, a solução muito menos, mas a partir de uma leitura de indicadores conseguiu-se acionar os responsáveis a tempo.

Leading indicators e Lagging indicators

Falando em solucionar problemas a tempo, temos encontrado na gestão do sucesso de clientes desafios em que somos levados a buscar indicadores que apontem um raio de ação e não apenas refletem problemas. É o caso do combate ao churn, ou taxa de cancelamento de clientes: a nível de gestão, se acompanharmos este número ainda que diariamente, poderemos no máximo aprender com os contratos desfeitos, mas nada podemos fazer para reverter o cancelamento, haja vista já terem acontecido.

Outro indicador para a gestão dos cancelamentos é a taxa de engajamento da base de clientes, ou seja, qual o percentual dos clientes está usando o produto da forma correta e na frequência ideal de uso. Partindo da escovação dos dentes, escrevi sobre este e outros indicadores para Customer Success aqui. Neste caso, o problema comunicado pelo indicador está em curso e pode ser trabalhado a tempo de evitarmos novos cancelamentos.

Isto faz da taxa de engajamento um leading indicator, que aponta para um problema em curso; enquanto a taxa de cancelamento, a nível de gestão, apenas reflete o problema ocorrido, o que a torna um lagging indicator.

Note que, em outra esfera, um indicador lagging pode ser mais leading: se estamos falando da direção da organização, que precisa entregar resultados anuais ao conselho de investidores, uma taxa de cancelamento mensal traz a oportunidade de revertermos os problemas encontrados nos próximos meses, isto se, a nível de gestão, conseguirmos explorar, aprender e aplicar melhorias dentro do prazo esperado – o que deve acontecer com maior frequência nos casos em que não nos apoiamos apenas em indicadores lagging, mas conseguimos trabalhar de forma mais proativa sobre os obstáculos encontrados.

A célebre frase (errada) sobre indicadores

Eu já perdi a conta das vezes que ouvi ou li a frase: “o que não é medido, não é melhorado”…

Alguns fazem da frase um mantra repetido ao menos uma vez por mês nas reuniões de time, vez ou outra conferindo-a a Peter Drucker. Pasme você que assim o faz, segundo o próprio Drucker Institute, o autor nunca teria dito esta frase.

O que Drucker teria dito, você notará a diferença a seguir, foi algo como: “o que é medido passa a ser gerenciado” ou, em seu original em inglês: “What gets measured, gets managed”.

Essa aparente pequena mudança traz duas importantes lições sobre a gestão de indicadores para Customer Success: a primeira delas nos faz lembrar que vivemos em um mundo de indivíduos agentes, ou seja, em um mundo em que cada decisão tomada hoje gera novas decisões a partir da primeira, algumas vezes surpreendentes e indesejáveis…

Assim, quando decidimos que o comissionamento do time de vendas será definido pelas vendas em si e só por elas, manobras como vender para leads indesejados ou tomar a vez do colega em uma negociação acabarão surgindo. Ou ainda quando se decide que partidos políticos só vão receber recursos – o chamado Fundo Partidário – se cumprirem com uma cota de 30% de candidaturas por cidadãs mulheres, como é o caso no Brasil, começam a aparecer candidaturas falsas em partidos que não conseguiriam cumprir com a meta.

Perceba que não estou me colocando contrário aos indicadores citados aqui. O que pontuo é o que a frase nos ensina: o que é medido, passa a ser gerenciado; não apenas melhorado seguindo o ideal contido apenas na cabeça de quem decidiu pela meta, mas passa a ser gerenciado visando os resultados dos indivíduos agentes que respondem por este indicador.

Daí a preocupação na escolha correta de indicadores para Customer Success, na regulamentação do que pode e do que não pode ser feito ao gerenciar determinado problema, na seleção e fiscalização dos agentes, etc.

Outra lição está ligada ao fator contextual de que falei antes: o fato de você não medir algo não faz com que este algo não exista mais. O problema continuará existindo, podendo mudar sem a sua intervenção. E como defende o autor de Miopia da mensuração, no link do Drucker Institute acima, o que Drucker percebia era a existência de fatores de cunho social que mal podiam ser mensurados, como o entusiasmo em cada colaborador que, melhor do que tratados com base em indicadores, deveriam ser otimizados a partir de um interesse genuíno pelo ser-humano sentado ao seu lado, o que só pode ser feito pelo ser-humano que ocupa a cadeira de líder, não por indicadores escritos em uma folha de papel.

O custo e o risco

Falando em folha de papel, vem à cabeça o fato de que todo indicador gerenciado, pessoal dedicado à coleta de dados, seus relatórios e apresentações geram custos. E uma regra geral da gestão de indicadores é: para ser gerenciado, seu custo deve ser inferior ao risco de não gerenciá-lo.

Para o desafio de reduzir custos e então conseguirmos gerenciar bons indicadores para Customer Success, a proposta de Bruce Temkin, papa do CX, é de muita ajuda: para ele, podemos trabalhar com o que chamou de Indicadores Operacionais (Operational Metrics) e Indicadores de Experiência (Experience Metrics).

Slide da palestra sobre Experience Management, de Bruce Temkin, mostrando a existência de dados operacionais e dados de experiência com que podemos trabalhar ao gerenciar indicadores de customer success

Estes refletem a experiência do cliente a partir de sua percepção, enquanto os primeiros são aproximações que apontam possíveis obstáculos operacionais a uma boa experiência.

No caso dos apps de mobilidade, por exemplo, como calcular o impacto da espera por um motorista na experiência dos usuários? Podemos fazer esta pergunta diretamente a eles, em uma pesquisa CSAT após cada corrida, buscando extrair um número de respostas que configure uma amostragem representativa da base.

Por outro lado, podemos olhar para os indicadores operacionais internos, calculando o tempo entre uma chamada, seu aceite pelo motorista e o início de corrida via app, dados a disposição do time interno em 100% dos casos. Apesar de não responder especificamente qual o impacto na experiência dos usuários, podemos supor que a redução do tempo de espera trará um impacto positivo; e podemos gerenciá-lo para este fim, deixando o uso de indicadores de experiência mais caros para os momentos em que realmente precisamos deste tipo de informação para tomar uma decisão.

Indicadores para Customer Success que promovem melhorias

Entre outros bons insights reunidos em um post no Medium, o Caco e o Raphael Albino falam sobre como não usar métricas:

“Nunca as use para penalizar, fazer a caça aos culpados, pois dessa maneira você criará um ambiente de insegurança e, na nossa vivência, este é o primeiro passo para o fracasso na aplicação das métricas”.

Este aprendizado é muito importante aos gestores de Customer Success, que diariamente lidam com o eterno sentimento de reduzir cancelamentos. Em 2021, não seja o gestor que estampa na parede quem perdeu mais clientes no último mês ou quem não conseguiu entregar seus projetos de Onboarding a tempo. Faça melhor: premie quem excedeu as metas e facilite o compartilhamento de boas práticas entre os colaboradores.

O aprendizado é igualmente importante para os gestores de Customer Experience, haja vista serem com frequência um time meio-de-campo, como gosto de dizer, um time que interage com diversos outros dentro da organização e, a partir do momento que utiliza indicadores para apontar dedos, passa a perder o apoio dos demais líderes. Se você é responsável pela coleta e leitura do NPS, por exemplo, ofereça seus insights aos líderes funcionais como se oferecesse uma lanterna a quem está no escuro; e não como se oferecesse um cartão amarelo.

Afinal, para dominarmos a gestão de indicadores como Weiner domina, temos de criar em nós uma obsessão por melhorias e não por mensuração.